quinta-feira, 27 de agosto de 2009

caro senhor

"Caro senhor, pobre senhor, bravo senhor, você é uma experiência do Criador do Universo. Você é a única criatura em todo o Universo que tem livre-arbítrio. Você é o único que precisa descobrir o que deve fazer a seguir - e por quê. Todos os demais são robôs, máquinas.Algumas pessoas parecem gostar de você, e outras parecem odiá-lo, e você deve se perguntar por quê.Elas são simplesmente máquinas de gostar e máquinas de odiar.Você está exausto e desmoralizado.Por que não estaria? Claro que é exaustivo ser obrigado a racionalizar o tempo todo num universo que não deveria ser racional."
 ( Kurt Vonnegut - Café da manhã dos campeões)

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

outro dela

Deitada no chão do banheiro, ela examina a claridade, analisa as rachaduras da parede e a velhice do espelho. Unhas vermelhas lascadas, pele branca, veias azuis esverdeadas, frio. Enrola o fio dos fones de ouvido em sua mão esquerda, enquanto a direita passa para a próxima música nostalgica. Mais um sábado depressivo. Vontade que os familiares saiam para que ela possa acender um cigarro na área de serviço. Vontade de sair, comprar a cerveja da garrafa verde e o cigarro do rótulo vermelho e sentar-se no meio fio de uma praça abandonada qualquer. Não quer ser vista, não quer ver ninguém. Saudade do beijo, do abraço,do sorriso. Quer sua inocência de volta, embalada pela roda gigante, algodão doce, música alegre e pedrinhas furta-cor. Quer carrocel,sorriso demente, infantil. Vida sem café, obrigações adultas, música depressiva, responsabilidades, concreto cinza e linhas modernas. quem tirou isso dela?

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

vermelho martini

Língua, dentes, lábios, metal, língua,lábios.
O gosto vermelho em sua boca, o cheiro doce de sua pele.
O barato saiu caro demais. Você sentiu quanto a ilusão findou-se naquela tarde de domingo. Esperou chorar, achou que iria, mas não conseguiu. O sal ainda não temperou seus olhos. Agora vê o novo à sua frente e teme, e duvida, e vai.
Vai mais um pouco pro canto de lá. Vai com as mãos por um lugar desconhecido. Vai. Vai. Vai mais pra perto de uma dose de felicidade. Uma dose de sossego engarrafada. Desce rasgando.
Língua, dentes, lábios.
Agora mais calma, agora gostando de todas as sensações.
Você amor, não merecia o inferno, mas decidiu passar por ele, encontrando lá diversão e contentamento infantil.
Criou a situação. Fantasiou toda essa mentira.
Acorde Dom, pois essa Capitu não carrega o filho de outro. Não carrega filho nenhum. Apenas a decepção de ter achado em seus lábios um sorriso casual temperado de nicotina.
Lábios, língua, língua, lábios, língua, língua.
Obrigada por me mostrar em quem posso confiar. Obrigada amor por nunca me chamar de amor ou dizer o quanto se importava com meu bem estar.
Obrigada amor por sua desconfiança em meu sangue e suor.
Ele entregava seu medo ao acaso.
Seus olhos. Olhos insanos. Caminha.
Caminha em direção ao nada e ao tudo.
E você querendo mais.
Tudo indicava o contrário de tudo que passou a saber.
Segue então na falta daqueles lábios e do gosto vermelho de martini.